sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Holocausto



Depois de ver algumas imagens sobre o holocausto em 27/01/2015, o menino assustado pergunta à sua mãe:

- Porque os homens matam outros homens?
- Será que já não cabem todos nesta liberdade de viver?
Ou este mundo tornou-se pequeno demais para eles?

Deus deve estar triste com estes que se julgam donos dos outros homens e que os maltratam. Que lhes roubam o direito à vida.
Porque será que Deus permite estas barbaridades?
Se fossem os pequenos eu entendia a sua fome por um pedaço de pão, mas são os grandes que mandam executar. São eles que levam os sorrisos  e os sonhos de tantos meninos.

Da África sopram ventos de gemidos. São povos espoliados, oprimidos, agredidos e perseguidos...E dizem depois que tudo foi por ordem de Alla... Que confusão... Nem Deus nem Alla mandam matar.

Os assassinos escondem-se de rosto tapado com armas nas mãos porque todos os seus actos não têm razão nem eles possuem um bom coração.
Luíscoelho
Janeiro/2015

quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

A menina Maria



(Noras no Moinho de Papel -Leiria)

Em Novembro de 2011 publiquei a história da Maria aqui no blogue. Recriei as magras lembranças que me sobraram e outras que eram do conhecimento público.
Esta semana tive conhecimento de mais abusos que lhe vão amargurando os dias. Agora com 82 anos sobram-lhe as doenças, o frio e o desprezo dos que deviam dar-lhe a mão.

Alguns dias, sem ter nada na mesa para se alimentar, vem para a rua e caminha sorrindo para todos. Na sua alma carrega a esperança de que alguém a irá ajudar.
- Será que alguém me vai oferecer um prato de sopa? Até mesmo um caldo de água quente?

Ontem dividiu a última fatia de pão em duas. O pão estava ressequido de tanto o guardar, mas os seus olhos brilharam de esperança pois cada parte seria um esconder da sua fome.
Hoje era dia de festa. Havia pão para o almoço. 
Depois será o que Deus quiser.
Juntou as duas mãos de silêncio. Orou e agradeceu.

Nem sabe quanto tempo ficou ali parada em frente daquele pedacinho de pão. Foram tantos os pensamentos que a assaltaram bruscamente e outras memórias que, sem querer, a fizeram reviver datas anteriores. Foram dias de mesa farta com pão para todos. Até os cães tinham direito a um caldo quente.
  

Hoje sobra-lhe um caneco com água da fonte. Santo Amaro alimenta-me com esta água que corre graciosamente na bica, ali à beira da estrada. Lá todos podem beber sem pagar, sem pedir por favor. A fonte é pública.

- Ai, meu Senhor e meu Deus! Ao que nós chegamos...Diz tentando aceitar toda a dor e tristeza.
À noite esconde-se como pode numa enxerga onde até os cobertores lhe cheiram ao bolor de uma sociedade falsa, hipócrita e injusta.
- Meu Deus se tanto pequei peço-Te perdão. Ajuda-me e dá-me forças para continuar a resistir.

Na sua humildade abdicou do usufruto daquela casa que foi depois vendida em hasta pública. 
Agora os novos proprietários querem forçá-la a sair de lá. Primeiro pediram-lhe aumento da renda. Depois entraram e roubaram-lhe as suas coisas. Levaram o que quiseram e espalharam o que sobrou pelo chão .

Recentemente cortaram-lhe os canos da garrafa de gaz de modo que o mesmo se espalhasse pelo interior da habitação.
Ao aproximar-se e sentindo o cheiro foi pedir socorro aos vizinhos que desligaram a garrafa e depois o quadro eléctrico.

O medo começa a tomar conta de todos os seus movimentos.
- Não tenho para onde ir. Não tenho família. Não tenho dinheiro.
A Maria desconhecia por completo o drama dos seus dias.
Prometeram deixá-la viver ali no seu canto, mas logo depois começaram as exigências.
Primeiro uma renda, depois um aumento para o dobro.

Finalmente são as ameaças.
- Tens de sair daqui. A bem ou a mal vais ter de sair. 
Agora são estes os sons que constantemente ouve dentro de si. 
Caminha e vai sorrindo.
Em silêncio suplica a Deus por misericórdia porque dos homens já nada espera, embruteceram no ódio, no desprezo e indiferença...
- Que será de mim?
Luícoelho
Janeiro/2015

Primeira Parte 

Menina e moça a trouxeram da sua aldeia, da sua casa e da sua família. Prometeram-lhe um mundo de felicidade e bem estar. 
Era uma moça vistosa, bonita e simpática.
O patrão, era um homem rico. Viúvo há bastantes anos, desde o nascimento da sua filha. 
A Maria cedo se viu dona de uma casa que não era a sua. Sozinha tinha de dar conta da cozinha, dos quartos e das roupas. Era muito trabalho.

O patrão era dono de uma das casas mais ricas desta região. Era uma casa agrícola mas tinha também uma parte comercial. Revenda e comércio de adubos, roupas e mercearia.
Havia trabalhadores fixos e outros que eram assalariados ao dia ou à semana. Trabalhadores a seco. Não tinham direito às refeições.

Cedo a Maria viu as manhas e artimanhas do patrão. Estava sempre a exigir mais trabalho sem recompensa nem pagamento.
Nesta casa não havia horários para os empregados terem os seus dias de folga ou as horas para descanso. Tinham de estar sempre disponíveis para todo o serviço e com boa cara.

Cedo a Maria conheceu a violência do seu amo que a forçava e a violava a seu belo prazer sempre que lhe apetecia.
Ela era franzina e não conseguia fazer-lhe frente e ele era manhoso e mau. Depois de a trancar num quarto obrigava-a a todas as sevícias de que era capaz. 
No fim exigia silêncio absoluto

A Maria vivia assustada pelos abusos diários e pelas dores que lhe causava, mas deixou-se vencer pelo medo. 
Se falasse ninguém iria acreditar nas suas palavras. Ele era um empresário rico e muito temido. 

Em troca do silêncio foi-lhe prometendo uma casa. 
- Um dia serás uma senhora e poderás viver a tua vida!...
A Maria viu outras moças serem abusadas pelo patrão e aqui as ameaças foram ainda maiores e mais graves.
- Se abrires a boca mato-te. Ficarás sem nada do que te prometi e ninguém acreditará no que disseres....

Foram longos anos de sofrimento silencioso até ao dia em que o velho morreu. Ela também tinha envelhecido. Estava magra e nem as roupas escondiam o seu corpo gasto. 
Pensava no seu íntimo - Agora, que irá ser de mim...?!
As filhas são herdeiras de tudo. Ele não passou de um mentiroso que se aproveitou de mim.

No testamento apareceu uma doação de "usufruto" de uma casinha em ruínas para a Maria. Por morte dela esta casinha pertenceria aos netos do falecido. 

Depois do funeral do patrão a herdeira mais velha, viúva e sem filhos, mandou a Maria, empregada, para a rua. 
- Tens a tua casa vai para lá... Aqui não ficas...
Esqueceu-se de uma vida de trabalho e dos abusos de que ela foi alvo. Ingratidão!... 
-Vou viver de quê...??? Ninguém me pagou, não me fizeram descontos para a Caixa de Previdência...

- A Senhora sabe dos abusos que o seu pai me fez? Julga-me culpada? Engana-se. 
Fui vítima, sem ninguém para me defender....Não podia falar, nem podia fugir....O mal estava feito e todos os dias eu tinha de suportar as dores e o desgosto sem me conseguir libertar daquelas garras.
- Não quero saber de mais nada, respondeu-lhe a herdeira. Hoje mesmo vais sair daqui. Desenrasca-te!

A Maria mudou-se levando consigo algumas coisas que lhe foram oferecendo. Reparou a habitação. Construiu uma casa de banho, e uma pequena horta.

Um dia vieram os herdeiros desta casa com uns papeis para  ela assinar, conta a Maria.
- São coisas das Finanças, não se preocupe. É uma hipoteca. 
Na sua boa-fé assinou sem ler nem pedir ajuda aos entendidos.
A Maria assinou a sua renuncia de usufruto em favor dos herdeiros.
Passados alguns meses, como os herdeiros não pagaram as dívidas, a casa e o quintal foi vendido em hasta pública.

Agora anda desesperada e nem sabe o que vai ser da sua vida.
- Enganaram-me, abusaram-me e agora despejam-me na rua sem nada... A vida foi madrasta má.
- Que mundo cão....que vida triste...
Não se vêem as lágrimas... percebe-se a sua dor e desilusão.
As cores são de um sangue ainda vivo a manchar-lhe os dias ....
Luíscoelho
Nov/2011


sábado, 17 de janeiro de 2015

Semear amor

Fotografia

Semeei-te de esperanças 
Neste amanhecer de palavras.
Recordações de amantes, 
De cores perdidas, errantes,
Que por querer já são escravas
Rejeitando outras alianças.

E até no entardecer dos dias 
Fomos semeando sonhos no olhar:
Searas simples de dor e penas,
Dias felizes de cores amenas.
Caminhadas que fizemos para chegar
Onde germinam tantas alegrias.

Campos semeados de ternura,
Espaços de alegria e de tristeza,
Conquistas que nos encheram de brio
Num tempo de amar ao desafio.
Sementes de amor e de beleza
Fizeram novos dias, nova cultura.
luíscoelho

Janeiro/2015

sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

Frio

 Banco de Imagem - gelado, e, sozinha. Fotosearch - Busca de Fotografias, Fotografia Poster, Imagens e Fotos Clip Art
(foto google)


Hoje o frio era mais frio. 
Já ninguém se lembrava de um dia assim. Era um frio de cortar. Gelava-nos por fora e por dentro e a noite prometia ser ainda mais dura.
As bátegas de chuva batiam descompassadas no telhado da casa. Às vezes o granizo tornava os batimentos mais graves e acelerados.

Tinha anoitecido mais cedo. As nuvens escuras cercaram tudo por ali à volta. Não se via ninguém nos campos. Era um mundo de silêncio.
Embrulhados numa serapilheira grossa foram acomodando todos os animais domésticos. Parecia que também estes procuravam um abrigo mais seguro, deixando transparecer o medo que os possuía.

Finalmente o pai entrou em casa. A sua presença dava-nos mais segurança. Trazia um molho de cavacas secas e um brilho de coragem e determinação no olhar. Tinha acabado o seu dia de trabalho. 
Pousou as cavacas num canto perto da lareira e depois foi tirar aquela serapilheira que lhe servia de capa. Sacudiu-a e pendurou-a num cabido que estava no alpendre à entrada da cozinha.  Finalmente sentou-se ao pé de nós.

Sem pedir licença fomo-nos encostando a ele. Estava gelado. Não nos afastou, mas abriu aquelas mãos grandes e voltando as palmas para a fogueira disse: 
- Ah...Que bom!Aqui estamos melhor.
Até parecia que estava com vontade de meter as mãos dentro das chamas. O cheiro das suas roupas ainda carregadas de chuva vieram ao nosso encontro quando o apertamos.
Depois procuramos um lugar nas suas penas e sentámo-nos um em cada joelho. Ele protegia-nos do calor com aqueles braços fortes que nos seguravam com carinho.

A mãe cuidava da ceia, mas os seus olhos estavam em nós. A frente da lareira estava livre para ela poder ver a panela da sopa.
Não sei o que comemos nessa noite. Muitos dias eram as sobras do almoço. 
Ao meio-dia, era servido um prato de sopa grossa. Nunca havia segundo prato, mas havia o "conduto" que era um pedaço de toucinho cozido com a sopa.
 Não éramos ricos, nem se podia desperdiçar nada.
Algumas vezes, a mãe juntava um copo de água nas sobras do almoço e depois, quando a panela começava a ferver, juntava um punhado de massa grossa e temperava com azeite e uma pitada de sal. 

No serão de hoje o pai, para nos distrair, perguntou:
- Vocês sabem quem é mais forte: O Sol ou o Vento?
Eles fizeram entre si uma aposta.
Quem seria capaz de tirar o casaco a um homem que caminhava na estrada.
Depois em silêncio olhou para nós e deixou-nos responder.
Afirmámos que era o vento. Aquela força que abana  as árvores ou que faz mover as velas de um moinho era o mais forte e respondemos convencidos da nossa verdade. Era o vento.
Logo aquelas cabecitas, encheram-se de respostas.
Era o vento! Era o vento! Só pode ser o vento que arranca as grandes árvores e que faz andar as nuvens...
Mas nós queríamos a resposta do pai. Tudo quanto ele nos dissesse  era o mais verdadeiro. O pai disse e pronto! Não há mais dúvidas.

Um sorriso calmo desenhava-se nos seus olhos o que  fazia aumentar as nossas dúvidas. 
- Será o Sol pai? Perguntou o mais velho.
Naquele momento e conservando aquele brilho no olhar contou-nos a história de um caminhante.
- Seguia pela estrada um homem, com o casaco vestido.
Estava muito vento. Pensei que a força do vento lhe arrancasse o casaco, mas quanto mais vento fazia mais ele apertava o casaco.
Durante algum tempo segurou o casaco com as duas mãos chegando quase a desequilibrar-se.
O vento não conseguiu vencê-lo.

Depois, num outro dia, o mesmo homem caminhava pela mesma estrada, mas estava muito sol.  O dia foi aquecendo e o calor do Sol obrigou-o a despir o casaco. O sol venceu.Tem mais força que o vento.

Oh! Mas assim não vale...O homem é que quis tirar o casaco...disse o mais pequenito.
Reparem que isto da Natureza não é bem assim. Um não é mais forte  que o outro. São apenas diferentes.  O Sol, o vento, a chuva ou a água são precisos para podermos viver com harmonia.
Cada coisa tem a sua importância e sem eles não poderíamos viver.  

A ceia estava na mesa.
Sentaram-se e comeram em silêncio.
Agora as colheres andavam mais lentas e já era com algum esforço que iam bebendo aquele caldo. O sono tornava-se cada vez mais atrevido.
Então a mãe pegou-lhes ao colo e deitou-os nas suas caminhas.
O dia foi grande nas suas corridas.  Brincadeiras que os ajudavam a crescer.
Luíscoelho
Janeiro/2015