Foto do google
Naquele dia o Sol acordou envergonhado e o frio parecia rasgar-lhe as mãos e a face. O seu olhar estava longe de todo aquele movimento.Descia a avenida do Brasil e depois seguiu pela avenida dos Estados Unidas da América em direcção ao Campo Grande.
O Hermínio caminhava ao acaso. Parecia que fugia de alguma coisa. Caminhava alheio ao frenesim dos carros e autocarros que se amontoavam nos semáforos e se enrodilhavam na rotunda do Relógio. Os seus olhos seguiam as pedras da calçada como que envergonhados.
Saiu da barraca, no bairro do Relógio, determinado a encontrar alguma resposta para as muitas preocupações que carregava naquela manhã.
Não tinha culpa de estar desempregado.
Não tinha culpa da doença da mulher, nem dos filhos que vieram sem fazer conta.
Trabalhou como um moiro, abrindo as valas nas ruas e passeios para os cabos de telefone, e outros dias para as águas ou o saneamento. Nunca reclamou de nada e também nunca faltou ao serviço quer chovesse ou fizesse frio.
Parece que os seus pensamentos pararam naquele dia em que o patrão avisou que ia fechar a firma por falta de trabalho. A concorrência é muita. Já não consigo pagar tantas despesas nem continuar com estes trabalhos. Passem pelo escritório para vos acertar as contas e rescindir os contratos.
Estas pequenas frases não o deixavam ver nem ouvir mais nada. Nem quis seguir no autocarro. Se andar a pé talvez me faça bem. Pode ser que consiga ver algum anuncio com interesse.
Continuava a ver apenas a figura do patrão e a recordar como ficou paralisado, sem forças para continuar. A picareta soltou-se-lhe das mãos.
Continuava com as suas perguntas:
- Acabamos o dia ? Viremos ainda durante a semana ou o resto do mês....? Como é........?
Reconstruía as informações do encarregado:
- Vamos acabar estes trabalhos aqui nesta rua, mas quem quiser sair já pode fazê-lo.....
Parece que deixaram de se ouvir os carros e todo aquele movimento diário. Não sabia se estava a sonhar ou a acordar de um pesadelo............ Aquelas frases queriam rebentar-lhe com a cabeça.
Seja o que Deus quiser...! Procurou encher-se de alguma coragem e esperança....
-Vou aproveitar todo o tempo que puder e até haver trabalho. Depois se verá o que vai acontecer....
Naquela manhã, doía-lhe não ter ainda solução. Tinha muito medo do futuro.
Pensava muito nos seus meninos. Eram tudo o que ele mais queria. Era por eles que vivia e trabalhava feito um escravo..........
A mulher, em casa, mesmo debilitada, procurava também um emprego e uma casa. Estava farta de viver numa Barraca sem nada.
Todas as semanas passava pelas assistentes sociais, na Câmara Municipal.
- Estamos a estudar o seu caso. Não está esquecida. Logo que encontremos emprego ou uma casa entraremos em contacto consigo. Vá procurando também....e assim sem grandes discursos a iam sacudindo todas as semanas.
À noite quando o marido regressava e todos juntos comiam um prato de sopa quente, iam trocando olhares interrogativos de um futuro incerto. Que será de nós....????
Recordavam os anos vividos nas suas aldeias, nas encostas da Serra da Lapa. Tinham saudades dos seus familiares e das festas e romarias onde se esqueciam das tribulações de cada dia.
Recordavam o seu sonho quando vieram para Lisboa, casados de fresco e guiados por outros vizinhos que lhes contavam maravilhas.
Recordaram ainda quando compraram os taipais da sua barraca e as telhas de chapa zincada.
Andámos ali aos domingos durante um mês para levantar isto tudo.
Todas as semanas saíam algumas pessoas do bairro de lata e logo vendiam as madeiras.
Os pobres com pouco se contentam e parecem que mesmo sem nada são felizes, dizia a mulher com os olhos fixos nos filhos e no marido.
Um dia havemos de ter sorte e uma casa para viver. Uma casa só nossa com um quintal para fazer uma horta.................Quem sabe...????
Luíscoelho
O Hermínio caminhava ao acaso. Parecia que fugia de alguma coisa. Caminhava alheio ao frenesim dos carros e autocarros que se amontoavam nos semáforos e se enrodilhavam na rotunda do Relógio. Os seus olhos seguiam as pedras da calçada como que envergonhados.
Saiu da barraca, no bairro do Relógio, determinado a encontrar alguma resposta para as muitas preocupações que carregava naquela manhã.
Não tinha culpa de estar desempregado.
Não tinha culpa da doença da mulher, nem dos filhos que vieram sem fazer conta.
Trabalhou como um moiro, abrindo as valas nas ruas e passeios para os cabos de telefone, e outros dias para as águas ou o saneamento. Nunca reclamou de nada e também nunca faltou ao serviço quer chovesse ou fizesse frio.
Parece que os seus pensamentos pararam naquele dia em que o patrão avisou que ia fechar a firma por falta de trabalho. A concorrência é muita. Já não consigo pagar tantas despesas nem continuar com estes trabalhos. Passem pelo escritório para vos acertar as contas e rescindir os contratos.
Estas pequenas frases não o deixavam ver nem ouvir mais nada. Nem quis seguir no autocarro. Se andar a pé talvez me faça bem. Pode ser que consiga ver algum anuncio com interesse.
Continuava a ver apenas a figura do patrão e a recordar como ficou paralisado, sem forças para continuar. A picareta soltou-se-lhe das mãos.
Continuava com as suas perguntas:
- Acabamos o dia ? Viremos ainda durante a semana ou o resto do mês....? Como é........?
Reconstruía as informações do encarregado:
- Vamos acabar estes trabalhos aqui nesta rua, mas quem quiser sair já pode fazê-lo.....
Parece que deixaram de se ouvir os carros e todo aquele movimento diário. Não sabia se estava a sonhar ou a acordar de um pesadelo............ Aquelas frases queriam rebentar-lhe com a cabeça.
Seja o que Deus quiser...! Procurou encher-se de alguma coragem e esperança....
-Vou aproveitar todo o tempo que puder e até haver trabalho. Depois se verá o que vai acontecer....
Naquela manhã, doía-lhe não ter ainda solução. Tinha muito medo do futuro.
Pensava muito nos seus meninos. Eram tudo o que ele mais queria. Era por eles que vivia e trabalhava feito um escravo..........
A mulher, em casa, mesmo debilitada, procurava também um emprego e uma casa. Estava farta de viver numa Barraca sem nada.
Todas as semanas passava pelas assistentes sociais, na Câmara Municipal.
- Estamos a estudar o seu caso. Não está esquecida. Logo que encontremos emprego ou uma casa entraremos em contacto consigo. Vá procurando também....e assim sem grandes discursos a iam sacudindo todas as semanas.
À noite quando o marido regressava e todos juntos comiam um prato de sopa quente, iam trocando olhares interrogativos de um futuro incerto. Que será de nós....????
Recordavam os anos vividos nas suas aldeias, nas encostas da Serra da Lapa. Tinham saudades dos seus familiares e das festas e romarias onde se esqueciam das tribulações de cada dia.
Recordavam o seu sonho quando vieram para Lisboa, casados de fresco e guiados por outros vizinhos que lhes contavam maravilhas.
Recordaram ainda quando compraram os taipais da sua barraca e as telhas de chapa zincada.
Andámos ali aos domingos durante um mês para levantar isto tudo.
Todas as semanas saíam algumas pessoas do bairro de lata e logo vendiam as madeiras.
Os pobres com pouco se contentam e parecem que mesmo sem nada são felizes, dizia a mulher com os olhos fixos nos filhos e no marido.
Um dia havemos de ter sorte e uma casa para viver. Uma casa só nossa com um quintal para fazer uma horta.................Quem sabe...????
Luíscoelho
Era o Aleixo que dizia:
ResponderEliminarO pão que sobra à riqueza
distribuido pela razão,
matava a fome à pobreza
e ainda sobrava pão...
Abraço
João
Que dura realidade!
ResponderEliminarQuem não gosta de um pão quentinho com manteiga no café da manhã? Usado como sinônimo de vida e trabalho, alimento do corpo e da alma...
Beijos
heli
Fez-me lembrar algo que o meu pai me contava nos idos de 40: o cardeal Cerejeira era frequentador da quinta onde o meu avô era caseiro, e o meu pai ouviu muitas o cardeal do regime dizer: "o pobre só precisa de duas camisas, uma para trabalhar e outra limpa para se apresentar diante dos senhores ao domingo de manhã na missa"!
ResponderEliminarÉ assim em todo lugar...Em todo País...No mundo...Por que?
ResponderEliminarCaro Luís
ResponderEliminarQuando li o teu post de hoje, tinha publicado uma canção do Fernando Tordo com o título “ontem sonhei com o futuro”
Talvez porque nasci num meio, onde em geral vivíamos em “casas” abarracadas (pinhal da feira) na Marinha Grande. Porque também conheci alguns Hermínios que foram tentar a sorte para a Capital. Senti o teu texto como que um murro no estômago. Já nos habituas-te a descrições extremamente realistas de personalidades que conheceste e conheces.
Antes fosse ficção meu caro.
Antes isto fizesse apenas parte do passado. Mas sabemos que faz parte do presente com tendência a que haja muitos mais Hermínios no futuro.
Abraço
O pão nada mais é q o símbolo do alimeno, da fraternidade e unão entre os seres humanos.
ResponderEliminarO Blog O TOQUE DE MIDAS
ResponderEliminarhttp://rosarinho12.blogspot.com/
deseja a todos os seus amigos
...uma semana Feliz!
Olá Luís
ResponderEliminarUma triste estória triste, mas que acontece muito mais do que imaginamos até hoje. Ainda bem que a esposa nunca perdeu a esperança.
Abração
Olá meu caro amigo!!! O mundo é cruel, em especial para os mais pobres, mas que afinal detém essa riqueza interior que você nos traz aqui com tanta ternura e força!!!
ResponderEliminarAproveito para informar que, por motivos de dificuldades em gerir diversos Blogues, resolvi reunificar meus 3 Blogues de Hobbies num só e juntar o Artesanato à Terapia Culinária com Receitas e ao meu Aprendizado Para Tocar Violão com músicas e acordes.
Agradeço visite algumas páginas do Novo Blogue de Artesanato e Hobbies já alteradas e actualizadas e me dê sua opinião a respeito num Inquérito que promovi. Obrigado, abraço, Zé Maria
Ao ler esta postagem voltei atrás no tempo. A um tempo muito difícil, que esperamos nunca mais voltar. Mas é com tristeza que vejo tudo a ruir à minha volta, como se o passado tivesse feito marcha atrás. Folha seca comentou este post, com aquela idoneidade a que já nos habituou. Gostei deste post e dos comentários aqui deixados.
ResponderEliminarUm abraço.
Olá, Luis
ResponderEliminarPassando para agradecer sua atenção num momento muito especial.
Estou voltando aos poucos.
Beijos
Quantos casos destes vivem hoje em dia nas nossas ruas,é triste demais
ResponderEliminarbeijinhos
Solta-se-me das mãos toda a capacidade de entender os homens...
ResponderEliminarUm beijo, Luís
Tocou-me muito este texto: uma situação tão real que até dói. Uma siuação que, infelizmente, nos é familiar, que nos aparece diante dos olhos no nosso dia-a-dia.
ResponderEliminarO sair da aldeia em busca de um futuro melhor(Sonhos...),as privações...e agora o despedimento, o medo do futuro...a responsabilidade de "ainda não ter arranjado nada", ....
Tão triste por ser tão real...(e tão bem escrito).
Parabéns peo teu texto, pelo teu alerta....
Bj
BShell
Luís
ResponderEliminarEste relato emocionante fala-nos dum dos Hermínios que se passam diariamnete ao nosso lado pelas ruas da capital sem nos darmos conta.
É uma dura realidade. Custa ser pobre, mas custa ainda mais ser pobre azarado.
Na minha região, no século passado, foram muitos os casos de sucesso de pessoas que abandonaram as suas aldeias e conseguiram atingir os objectivos de vida melhor. No entanto , houve os que não conseguiram. Desses, alguns regressaram à aldeia e por lá permaneceram, vivendo com o pouco que a terra lhes dava. Outros, por vergonha, ficaram por Lisboa vivendo de esperança. Felizmente, foram raros.
Espero que muitos daqueles que tiveram sucesso, não se tenham, num futuro próximo, que regressar também.
Beijinhos
Lourdes
Triste e real. Atual, por mais que insistamos em fechar os olhos e dizer que vivemos em outros tempos, mundo mais moderno. A incerteza ainda ronda milhares de lares mundo afora: "Que será de nós....????".
ResponderEliminarAbraços,
Cida.
Cenários de pobreza que gostávamos de ver erradicados mas que, pelo contrário, se multiplicam
ResponderEliminarAh, Luis, existem tantas pessoas a sofrer com interrogações sobre o futuro, e até mesmo o presente lhes pesam nos ombros.
ResponderEliminarQue dera viver num sistema diferente, onde todos vivessem em paz e cheios de saúde, com suas casas própiras e seus quintais para plantarem desde frutas , legumes, e até flores.
Deus algum dia há de mudar esse quadro.
Lindo e tocante post
Abraços e um bom dia pra ti
Lindo e real para tantos...Ainda bem que apesar de tudo, a esperança não faltava.Quem sabe??? Tomara! abraços,chica
ResponderEliminar..."Uma casa só nossa
ResponderEliminarcom um quintal para
fazer uma horta......
Quem sabe...????"
e a vida seguindo seu rumo!
bj, poeta!
Isto fez-me lembrar a historia de meus pais. Pobres, humildes, mas sempre dignos no tao pouco ter e que termina também como termina o texto.
ResponderEliminarResumiria a historia triste mas tão digna no sofrimento, pelo final esperançoso como alguém que nao se abate mas também nao se revolta, o que é muito importante:
"Um dia havemos de ter sorte e uma casa para viver. Uma casa só nossa com um quintal para fazer uma horta....Quem sabe...????"
Assim foram os meus pais. Assim foram os meus pais. Oxalá agora desfrutem das primícias celestes, nao em banquetes, mas em gozo eterno de quem sorri e recebe o que tanto sempre almejou.
Amigo: infelizmente, é cada vez mais assim!
ResponderEliminarEnquanto uns procuram o alimento nas lixeiras das grandes cidades, outros engordam, como alarves e deitam fora o que lhes sobra.Tenhamos a Esperança da mudança...é isso que nos resta!
Beijo
Mª ELISA
Esta triste realidade aflige multidões diariamente.
ResponderEliminarMuito bem escrito, é uma viagem seus contos.
Luis, saudades de você.
Tenha uma boa noite.
caro Luis
ResponderEliminarArrepiei-me ao ler este texto. Cheguei a emocionar-me com a forma como, tão bem, expressou a pobreza, a devastação dos sonhos de outrora e no fim uma réstea de esperança num futuro que nem se sabe se é longínquo, se próximo...
Gostei muito, mas fez-me temer pelos meus filhos... porque julgo que voltaremos a tempos em que presenciaremos destes retratos no nosso quotidiano.
Abraço
Esta história emocionou-me porque penso que é multiplicada por milhares de famílias neste tempo de crise.
ResponderEliminarGostava de ir por aí ajudar os que necessitassem...tenho tantos projectos na cabeça mas...sózinha não consigo pô-los de pé...
Deus há-de dar-me sinais.
Graça
Hoje vim deixar um carinho a você que sigo a algum tempo atravez do blog do Everson.
ResponderEliminarE deparei com uma postagem que na verdade chorei .
Desejo uma feliz guinta feira
vou estar por aqui sempre.
beijos carinhosos.
Evanir..
www.fonte-amor.zip.net
Um otimo dia pra ti meu amigo, paz, amor e poesia sempre,,,eu conheço a cação sim, ela é linda...abraços...
ResponderEliminarEste texto está bem sintetizado na quadra de aleixo apresentada por João de Sousa Teixeira..Tiro o meu chapéu
ResponderEliminara todo o conteúdo...
Texto seu muito bem escrito, mostrando uma triste realidade, infelizmente...mas a esperança sempre continua...
ResponderEliminarBeijos...
Valéria
Quem sabe??? Histórias não se repitam... que tenhamos memória... que tenhamos voz e ação!
ResponderEliminarBeijuuss n.c.
Querido amigo, uma história tão triste e tão real. Quanta dor e miséria existe por cá e por esse mundo fora também. Doi a alma pensar que existe tanta riqueza, mas está tão mal distribuida.
ResponderEliminarInfelizmente penso que num futuro próximo, em cada vez mais lares, vai haver apenas "o Pão do amor".
Tenha um excelente fim de semana
Beijinhos
Maria
Um belissimo final de semana pra ti amigo,,abraços.
ResponderEliminarEsta é a realidade de tantos e muito bem contada por ti, cheia de sensibilidade e emoção.
ResponderEliminarParabéns! Deixo-te abraços, amigo
Gosto dos teus textos, simples assim!
ResponderEliminarBeijossss
Num texto muito bem escrito retrataste aquilo que vi muito na aldeia onde nasci e onde vivi até aos 24 anos. Julguei que nunca mais veria casos desses, mas infelizmente estamos a vê-los de novo. Sempre digo que os mais pobres são aqueles que se conformam com pouco e esse pouco é o suficiente para que se sintam felizes. Esse pouco que os nossos governantes poderiam proporcionar não fossem os desperdícios que vemos com salários astronómicos. Infelizmente é esta a realidade, mas temos que manter a esperança de que a força nessas pessoas seja maior que a desgraça e que consigam adquirir o pouco que, para eles, é mais que suficiente. Parabéns pelos belíssimos testemunhos, Luis. Um bom fim de semana e um beijinho
ResponderEliminarEmília
EM VEZ PRIMEIRA EM VIDA MINHA,UMA BRONCA RECEBO EM POESIA FUERMA!
ResponderEliminarTRATEI DE JEITO TOMAR,POETA AMIGO E ANJO ESCRIBA!
VIVA LA VIE
OBRIGADO
VIVER É SIM,PURA MAGIA
Comovente!
ResponderEliminarBjs e ótimo fds.
Impressionante este seu texto!
ResponderEliminarTão real que faz doer o coração.
Abç
G.J.
Olá,
ResponderEliminaragradeço a visita ao Iguarias Caseiras e o ter ficado seguidor desta modesta cozinha.
Fiquei impressionada com o seu texto,..., tão real..., quantas famílias não vivem esta situação, o desespero de não ter pão para dar aos filhos,...enfim, estamos a passar uma época bem difícil.
Um abraço, e bom fim-de-semana
Quem não tem sonhos?
ResponderEliminarUma casa com quintal?
Também eu queria...
Um abraço