sábado, 13 de outubro de 2012

Dia da Ascensão



O dia da Ascensão era o dia mais sagrado dos católicos. Afirmavam que os passarinhos neste dia não voavam e como os passarinhos todos os cristãos deveriam respeitar este dia. 
Era uma homenagem ao Senhor Jesus que neste dia subiu aos Céus vivo e ressuscitado.

Cristo venceu a morte e ressuscitou, mas os seus Apóstolos ficaram vazios da força do Espírito Santo e andavam desnorteados. Jesus passou mais quarenta dias ensinando-os e fazendo-os trabalhar.
- "Ide e ensinai o Evangelho. Quem acreditar será salvo. Curai os doentes. Meu Pai que está no Céu, não vos deixará sem recompensa. A força e a Luz do Espírito Santo guiar-vos-à."

Na aldeia os sinos tocaram de madrugada. Aquele som cortava os vales e os montes num toque festivo e convidativo.  Cada um vestiu as suas roupas domingueiras e dirigiram-se para a Igreja.
Era dever dos cristãos ouvir missa inteira aos domingos e dias santos de guarda. O senhor prior até sabia o lugar de cada pessoa dentro da igreja. Se  faltasse alguém ele devia saber porquê.

O pai levou consigo os rapazes e foi para a Capela Mor onde apenas estavam os homens. Ajoelharam-se na pedra fria e gasta e ensinou os filhos a fazerem o sinal da cruz.
Depois levantaram-se e esperaram  de pé e em silêncio que o senhor prior entrasse e começasse a Oração.
Se algum dos garotos olhasse para trás ou fizesse barulho levava um tabefe chamando-o ao respeito.

A mãe entrou pela porta do fundo da Igreja, porta principal, e caminhou com as filhas até meio da igreja onde ainda havia espaço para elas. Como o pai, também ela ajudou as mais novas a fazer o sinal da cruz e a guardarem silêncio.

Ouvia-se um leve murmurar de orações soltas e desencontradas umas das outras. Cada um pedia a Deus por si e pelos seus, pelos vivos e falecidos, pelas searas e pelos animais, pelo tempo e pela chuva que lhes regava os campos.

O sacristão acendeu as velas e logo depois entrou o senhor prior todo ornamentado. Vestes brancas, sinal de festa e de alegria. Pararam as orações pessoais para ouvir uma  língua estrangeira que repetia sempre as mesmas coisas de costas voltadas para a assembleia.

Depois de algum tempo, o senhor padre voltou-se para nós e começou a falar a nossa língua e a dar explicações certamente daquilo que só ele leu e também só ele podia entender.
A segunda parte da liturgia continuou na língua estrangeira que nós não entendíamos.

À saída, no adro, cumprimentaram-se os familiares e amigos,  regressando a casa pelo mesmo caminho.
A manhã passou depressa, sem nada de especial. O pai, depois de trocar de roupa, tratou dos animais e a mãe fez o almoço.

Ao meio dia já os garotos enfadavam a mãe dizendo:
- Tenho fome !...Era o cheirinho fresco do guisado que estava quase pronto.
- Vão chamar o pai e lavar as mãos que eu já levo a comida para a mesa, disse-lhes ela.

- Mãe o que é hoje o nosso almoço ? Cheira muito bem...hum !
- Vá, vão para a mesa. 
Esperaram que o pai entrasse e só depois se sentaram.
A mãe dividiu a comida e recomendou-lhes que não dissessem a ninguém que tinham comido frango com arroz e ervilhas.

- Se os tios sabem que comemos frango chamam-nos estragados.
- Então o que vamos responder ?
- Digam que comeram sopa de feijão e couve e que estava muito boa. Entendido ? Vejam lá se não nos deixam ficar mal.

Toda a sociedade tinha de  se reger pelos mesmos códigos sociais mas dentro de cada família havia uma distância que os fazia ser diferentes.
Como eram saborosos os almoços ao domingo ou dia santo, feitos num tacho de barro que a mãe colocava num tripé na lareira. 
Luíscoelho

(foto do blog de Luísa Alexandra)