segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

Natal 2014

Fotografia

Natal- 2014
Quero escrever um último conto,
Talvez uma poesia, um canto com magia. 
Quero escrever como se viesse agradecer,
Talvez dizer que vos amo e sobretudo saber
Quanto me alegra e alimenta a vossa simpatia.

Quero escrever somente o que me vai na alma,
Aquilo que vivemos em cada dia, em cada ano,
Dizer com sinceridade palavras de ternura.
Semear amor nestes campos onde se cura
E viver em cada dia sem do amor ter mais engano.

Quero escrever sem do tempo me perder,

Nem fazer ou recordar outras lembranças. 
Quero fazer amigos mais perto como presentes
E os inimigos mui distantes, esquecidos e ausentes 
Quero amar sem ilusões, quero viver com esperança. 

A vida corre numa roda que faz cada momento

E nós somos pó neste mundo e neste tempo.
Nada temos e nada somos. Voamos como o vento.
Deuses que nos amais dai-nos mais amor como presente
Dai-nos mais vida se o Vosso Amor tanto consente.
Luíscoelho
Dezembro/2014

Votos de um Bom Ano de 2015 para todos os meus amigos.

Os que vieram e ficaram ou os que passaram e seguiram.

sábado, 20 de dezembro de 2014

Sons da madrugada


Não sei porque uivam os cães,
Rugindo no abrir da madrugada,
Nem porque afinam as vozes
Estridentes e descompassadas.
Bombardeiam a suavidade da manhã
Estilhaçam o silêncio nascido nas estrelas.
Porquê tanta maldade crua e vã?
Será que têm alguma necessidade,
Ou querem avisar-nos de alguma calamidade?
Calai-vos algum tempo por caridade!
Já não suporto tanto latir à desgarrada.
Podiam uivar perto do meio-dia
Poderiam organizar com os galos uma sinfonia…
Por favor parem de chapinhar, 
Latindo impacientes ao dia amordaçado.
Sede dóceis e dar-vos-ei um carinho
E acabará este fado triste e desajeitado.
Calai-vos hoje e apenas por vossa vontade.
Estou cansado deste suplício e barbaridade!
Luíscoelho
Dezembro 2014

Nota:
Agradeço a todos os comentários e a partilha de pensamentos.
Naquela madrugada,lá fora, os cães uivavam insistentemente
Eram gritos incomodativos.Não os podia calar.
Fui escrevendo procurando saber porque uivam desesperados algumas noites. Terão outros motivos. Razões que desconheço.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

Só te digo



É madrugada.

Bebo silenciosamente 
Esta solidão.
No escuro da noite
Deixo que a saudade me abrace.
Nestas horas 
Quero dizer-te com carinho 
Aquilo que nunca te disse,
Nem meus lábios segredaram
A vida que te dedico.
Tu estás aqui comigo
Ou serei eu que vou contigo.
Serás tu a sombra dos meus filhos?
Desejos dispersos em novos trilhos.
Só te digo apenas isto: 
- Os meus dias acabaram 
Nos sonhos que já partiram.
luíscoelho
Dezembro/2014

sábado, 6 de dezembro de 2014

Deste-me esperança

Fotografia

Deste-me esperança num fio de Sol
Era fino e frágil, mas trazia felicidade.
Bailava no olhar com que nos amávamos
Tinha o brilho do amor que nos aproximava.

Deste-me esperança numa gota de orvalho
Tão leve e suave, diamante de muita raridade.
Os raios de sol tornavam-na transparente
Nas cores mais belas que o arco-íris consente.

Deste-me esperança no brilho dos teus olhos
A mais suave luz deste nosso entardecer.
Encantados parámos. Depois quisemos saber: 
Onde vamos saciar esta fome de um só querer?

luíscoelho
Dezembro/2014

segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Tenho sede de ti



Tenho sede de ti
Nos dias que morrem
Aqui depois do anoitecer,
Tenho sede de ti
Quando o silêncio arrefece
E eu não sei esquecer-te.

Tenho sede de ti
Quando os ventos sopram
Na solidão do amanhecer
Tenho sede de ti
No calor dos desejos,
Quando as manhãs tecem
A loucura dos beijos

Tenho sede de ti
Quando nos deitamos 
Numa esperança de vida
Tenho sede de ti
 Nesta aventura perdida
Com que nos amamos
Tenho sede de ti
Agora e aqui

Luíscoelho

Novembro/2014

sexta-feira, 14 de novembro de 2014

A - B - C - D

Fotografia
( Moinho de Papel - Leiria)

Amanhecem frias as madrugadas
Abrindo as portas do meu ser.
Amantes que se despem por querer,
Amor que se faz à luz do dia.

Bebo as gotas do orvalho a cada instante,
Belos cristais retidos em cada planta,
Beijos que nascem no fundo da garganta,
Bebidas que nos enchem de magia.

Canto por encanto as mágoas e as dores,
Canto o Sol que nos aquece e alumia,
Canto a chuva, o vento e a invernia,
Canto os meus amores com alegria.

Deixo o tempo voar sem o deter,
Deixo a Lua lá no Céu desaparecer,
Deixo a vida abraçar-me e assim viver,
Deixo tudo já só quero esta harmonia.

É este o meu fado e o meu destino:
Amar assim o despertar das madrugadas,
Beber a vida nestes copos de marfim,
Cantar ao desafio as horas afortunadas,  
E erguer-me assim todos os dias.
luíscoelho 

sábado, 8 de novembro de 2014

Mariazinha

Fotografia
Marcas da nossa cidade - 2009

Veio de longe, de muito longe. Veio do Baixo Alentejo. 
Nas voltas que a vida dá, veio completar aqui os seus dias. Aqui viveu, trabalhou e também aqui criou muitas das suas raízes. 
Os pais eram assalariados. Viviam com uma sopa e um pedaço de pão de trigo. Tinham gravado no rosto o selo da pobreza envergonhada.
Não tinham possibilidade de dar aos filhos uma formação diferente da sua, nem poderiam ensinar-lhes a esperança de uma vida melhor.

No entardecer dos dias, de regresso a casa, a situação agravava-se. O pai sofria o cansaço que trazia nos ossos e na alma a dor de um salário pequeno, quase nada. Depois tinha de suportar o mau feitio da mulher.
Parecia uma ladainha que se repetia todas as noites.
Quase nem o deixava sentar na ponta do banco da cozinha :
- Porque assim e assado … E mais isto e mais aquilo … Nunca mais saímos desta miséria…   
- Pois sim...Tá, bem tá...Tu lá sabes...Nem quero discutir contigo. Irra, que mau feitio…
Parecia que aquela mulher tinha prazer de contrariar o marido.

A Mariazinha gostava de ir à Igreja e de participar em todas as celebrações, mas a mãe estava sempre a ralhar com ela.
- Isso de missas e de igreja é só para quem não tem mais que fazer...Ouviste?
Já te disse, vezes sem conta, que não te quero ver por lá. Aprende a fazer alguma coisa melhor.

- Podes bater-me à vontade. Eu irei sempre que puder à catequese e às celebrações religiosas cá na terra. Nunca deixei de fazer as minhas obrigações e tu não podes impedir-me.
- Estás a pedi-las...Estás, estás, respondia a mãe, levantando a mão com ar ameaçador.

Um dia o pai finou-se. Foi uma coisa que lhe deu. Coitado! A vida foi dura demais.
Depois que casou com aquela rapariga parece que ainda foi pior. Ela era esperta, mas aquele mau feitio era uma desgraça. Quem cá fica, diz povo, sempre se governa, o mal é de quem se vai.  
Outros acrescentavam:
- Esta vida é uma ilusão.
Ele estava cansado de aturar a mulher e de acreditar que um dia a sua vida iria mudar para melhor...São mentiras que carregamos todos e todos os dias.

Algum tempo depois da morte do pai o filho foi para a tropa. Depois continuou na polícia. Arranjou uma namorada e por lá ficou, pela cidade.
A Mariazinha, continuava junto da mãe, mas a vida era cada dia mais difícil. Um dia juntou as suas coisas e veio para Lisboa.
Não esperou que o irmão lhe arranjasse emprego.
- A vida é um desafio, dizia confiante.
Conseguiu trabalho num armazém, onde organizava as facturas de débitos e créditos e os saldos respectivos. Estudou e trabalhou. Nunca cruzou os braços.

Na rotina dos dias e das pessoas com quem se cruzava, acabou por conhecer o seu futuro marido. Ambos alimentavam um sonho e também o desejo de se completaram nas suas carências e afectos.
Após algum tempo de namoro, organizaram o seu casamento e foram viver para outra cidade. Depressa fizeram novas amizades. A sua alegria era contagiante. Todos gostavam de estar perto da Mariazinha.
Os anos amadureceram as amizades, o respeito, a bondade e os sorrisos de todos com quem se cruzavam.

Deram aos filhos o melhor dos seus anos e das suas vidas.
Não se pouparam a esforços para construírem a sua casa e a sua família. O marido era o seu melhor amigo. Estava sempre ao seu lado e ambos formavam um todo. O amor era vida que saía das suas palavras e acções.
A felicidade não tem tempo nem tem preço. É uma dádiva que vai acontecendo e que nos alimenta em cada dia.

Alzheimer
Um dia, ainda antes de se reformar, foi ao seu médico para fazer exames. Gostava de saber as razões do seu cansaço.
Em pouco tempo o médico diz-lhe:
- Está aqui uma indicação de alzheimer. Não se assuste, hoje existem tratamentos. Vamos cuidar de si para que se sinta sempre bem e por muitos anos.
No silêncio que se seguiu surgiram duas lágrimas que brilharam correndo desamparadas naquele rosto sempre sorridente. Tudo acaba…Que vida a minha.

- Jesus não podes fazer isto comigo...Confiei em Ti. Cura-me.

A doença foi progressiva e os medicamentos foram retalhando aquele corpo de mulher.
Ao lado, o marido também sofria, mas com muita paciência foi ajudando em tudo o que lhe era possível. Respondia sempre com o mesmo carinho a todas as perguntas, repetidas vezes sem conta.
Conservava sempre um sorriso encantador e com palavras amigas convidava-a a caminhar. Depois colocava-se na sua frente e estendia-lhe as mãos num convite para uma dança a dois para a ver de novo a dar uns passos.

A Mariazinha vencia aqueles momentos de medo que a paralisavam e apoiada no marido recomeçava a andar com normalidade.
Era bonito vê-los numa luta contra a doença que a ia desgastando.
Mais tarde as noites, a higiene pessoal e tantas outras tarefas comuns tornaram-se num pesado fardo.
No mesmo quarto separaram as camas. Talvez assim pudessem descansar, mas a situação piorava cada vez mais.
A Mariazinha está lúcida e sabe das suas fraquezas.

Ambos escolhem um lar onde tenha assistência. Aceitou esta nova residência como quem procura a cura dos seus males.
Os médicos alteraram a medicação.
Já passaram mais de quinze anos desde que lhe foi descoberta a doença. 
Diariamente o marido passa as tardes fazendo-lhe companhia e aos Domingos leva-a até a casa onde almoça com os filhos e descansa na sua cama. Aceita o regresso ao Lar mas, no seu interior, fica revoltada porque não pode já passar sem a ajuda dos que lhe prestam assistência.

Neste mês fomos visitá-la. Era a festa das suas 70 Primaveras.
Conheceu-nos e sorriu. Depois fechou-se num pesado silêncio. 
Os seus pés não aceitam a ordem para caminhar, as palavras ficam presas na garganta. Não consegue expressar-se e os seus olhos agora estão suplicantes. Ajudem-me.

Partilhámos o bolo de aniversário e cantámos. Vimos o seu rosto de agradecimento onde a dor é uma marca constante. Depois saímos prometendo voltar brevemente.
Esta promessa tem muito peso. Não cura, mas alivia muito.
Ficámos a pensar:

- Onde está a Mariazinha que nós todos conhecemos?

sábado, 1 de novembro de 2014

O Verão de São Martinho

Fotografia
( foto no Agro Museu D. Julinha em Ortigosa - Leiria)

O Verão de São Martinho  este ano veio mais cedo,
Oferecendo-nos bom tempo com calor e muito Sol
E o povo ficou contente com este tempo no rol.
Secou e guardou no celeiro os cereais em segredo
Porque em breve tudo termina e é preciso ser prudente.

Depois virá outro tempo de Outono ou Invernia
Virá chuva, virá vento, mau tempo constantemente.
Os dias serão mais pequenos e mais frios seguramente
E todos irão fugir da saraivada, do granizo e ventania
Abrigando-se à lareira ao calor duma fogueira.

São Martinho leva-nos à adega para provar o vinho
Aquecendo-nos a alma por fora como por dentro,
Até as castanhas assadas se tornam num bom alimento,
Comidas em companhia, ou até mesmo sozinho
Esquecendo o temporal e de frente para o braseiro.

São Martinho foi amigo dos pobres, dos sem-abrigo
Deu a capa aos mais fracos, aos mais tristes e velhinhos
E quando mais nada tinha deu-lhes um Verão de carinhos.
Que os dias não fossem duros nem o frio fosse um castigo
Bebendo apenas um copo de água-pé ou de vinho. 
Luíscoelho
Novembro/2014

terça-feira, 21 de outubro de 2014

07 de Outubro de 2014



 A manhã corria silenciosa. O dia não era de muito Sol, mas não chovia.  
O telemóvel quebrou o silêncio.
Alguém apareceu inesperadamente. Aquela voz que lhe invadia a casa estragou-lhe o dia e  ainda os dias seguintes.  
Começou um dialogo ou talvez um monólogo, pois só falava do outro lado.
O tio Luís estava abismado, mas os telemóveis são assim -  descarados e muitas vezes inoportunos. 
Ainda assim conteve-se para não lhe responder à letra.
Finalmente perguntou-lhe:
- Afinal diz-me o que é que tu queres? Não te adianta tanto azedume.
- Podes chegar aqui ao pinhal das Enxurgueiras?
- Claro, daqui por alguns minutos lá estarei. 
"Quem não deve não teme" - diz o povo.

O tio Luís, ao contar a história, começou a moderar a voz. As cores do rosto empalideceram. Parecia que se engasgava. Muitas palavras ficavam por dizer.
- Tenha calma tio.Tudo se resolve. Conte-nos lá o que lhe aconteceu?
- Quando cheguei ao pinhal, continuou, já lá estava o proprietário do outro pinhal  confinante e que havia feito o telefonema. O homem parecia desvairado.

- Aqui nunca conheci marco. Enquanto  falava começou a arrancar as pedras que serviam de marco e a jogá-las para o meio do mato. 
- Alto aí! Não mexes em mais nada, disse-lhe o tio Luís. Se não conhecias, perguntavas. Esse marco sempre esteve aí desde os tempo dos teus pais e dos meus.

O outro nem ouviu nem deu razão às palavras e às provas existentes no terreno. Arrancou as restantes pedras a que os antigos chamavam "testemunhas" e que eram colocadas lateralmente junto à pedra central, jogando-as também pelo pinhal.
- Arrancar um marco é crime. Sabias?
Estás a criar uma guerra entre nós e nunca saberás como vai acabar.

Estavam sozinhos. Não havia testemunhas. Tive medo de ser também agredido. Abandonei o lugar. Aquele vizinho parecia um demónio vivo...
Mais tarde e com testemunhas voltámos lá. 
O confinante arrancou o marco cavou o terreno, eliminando todas as provas do marco e outros sinais do terreno.
- Calma aí tio. Não se enerve mais, dissemos-lhe.
Esse fulano não presta. Perdeu o juízo e a razão.
Uns metros de terreno não fazem a diferença, nem valem que um homem se enerve dessa maneira. 
- Aquilo que mais me custa, disse, é a falta de respeito pelos mais velhos e a falta de princípios morais.

Sempre se ouviu dizer:
«Onde existem marcos, não existem dúvidas»

Quando lhe disse para recolocar tudo como estava respondeu:
- Não senhor, não ponho estas pedras aí nesse lugar. Foste tu que arrancaste os marcos.
Cada vez se encrespava mais como se isso lhe conferisse razão.
- Olha bem para o que fazes e o que dizes. Não tens razão para fazeres isto. É uma vergonha para as nossas famílias.
Acabaste de arrancar o marco e agora culpas-me a mim? Certamente não estás bem da cabeça.

- Sempre cortei o mato aqui deste lado, disse ele, convencido que isso lhe dava direito a uns metros a mais.
- Se cortaste o mato aqui deste lado foi porque não respeitaste nem os marcos nem os vizinhos, mas isso não te dá razão nem justifica os teus actos.

Que Deus nos livre dos gananciosos e dos loucos, concluiu o tio Luís, com um ar triste e pensativo.
E nós acrescentámos:
- Não foi exemplo nem ensinamento que os pais lhe tivessem dado. Eram pessoas de bem, concluíram. Mas no olhar do tio desenhava-se uma tristeza muito grande.
Luíscoelho
Outubro/2014

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Preciso de orar


Fotografia
(Cá em casa)

Preciso de rezar
As orações que aprendi
Desde o tempo de sonhar,
Quando ainda acreditava,
Que Jesus também rezava
E a todos ensinava
Com palavras de abraçar.

Preciso de rezar
Dizendo como quem pede
O pão para todos os dias
E o perdão a toda a hora.
O Senhor Deus já nos concede,
Saúde, a maior das alegrias
Em todo o tempo e agora.

Preciso de rezar
No silêncio dos meus dias,
Pedindo a Paz para o mundo,
Pelas crianças sem amor.
Pedir pela família humana, 
Será ainda mais profundo,
Mas se rezar não é pedir, Deus me perdoe
Já nada sei e tudo confundo.

Preciso de orar e também acreditar
Que Jesus nos veio salvar
Luíscoelho

Poema para a minha mulher no dia do seu aniversário - 15/10/1950

Hoje pediu-me para agradecer a todos o carinho de parabéns. 
Viver é um presente - oferta de Deus.

domingo, 12 de outubro de 2014

O Pisão - Parque de Merendas

Fotografia

Pisão - Parque de merendas da Bajouca - Leiria

Encontrei esta foto esquecida no meio de muitas que vou fazendo. Sempre que vamos a algum lado levo a minha máquina.
É pequena e fácil de usar . Posso guardá-la no bolso do casaco. Usa duas pilhas normais de 1,5 e tem um cartão de memória para quase mil imagens.

Foi uma prenda que me ofereci no fim de quarenta anos de trabalho. Criámos uma amizade instantânea. Andamos sempre juntos. Não é necessário mandar revelar as fotos. Basta passá-las para o computador e depois para uma pene. Assim todos podemos vê-las sempre que quisermos.

Em 2009 fui à Worten. Procurei e escolhi esta entre as mais simples e acessíveis ao meu bolso - Coolpoix L19
Passados dois anos a tampa que segura as pilhas lascou e partiu. Voltei à loja e procurei saber se era possível a reparação e quanto iria custar.
Ao receber a resposta fiquei sem palavras. 
Querem mais pelo arranjo do que me custou a máquina.
Guardei-a e saí desmotivado. Péssima assistência.
Eles também não tem culpa da nossa relação de amizade. 

Agora estou decidido a encontrar uma nova. 
Não há pressa e também não poderei gastar ali o que poderá  fazer falta noutro lado.
Um dia destes, decido com rapidez e compro outra ainda melhor. Afinal há momentos que registamos e que mais tarde podemos reviver através de simples fotografias.

Pisão
Um dia, recebemos um convite para um lanche no Pisão - Parque de merendas da Bajouca - Leiria. Foi dos primeiros aqui nesta região. Hoje existem muitos e quase todos estão lotados aos 
fins-de-semana. As pessoas levam a comida e a bebida e podem passar um dia de convívio e lazer com os amigos e familiares nesses parques. Poderão ainda confeccionar no local alguns grelhados o que torna tudo ainda mais apetitoso. 
Talvez não fique bem fazer aqui um elogio, mas atrevo-me a dizer que o Pisão é um local fabuloso.

A Juventude do grupo ABAD - deu todo o seu entusiasmo para recuperar aquela parte da mata deixada ao abandono. Procuraram os proprietários e obtiveram autorização para cortar as silvas e outros arbustos conservando os carvalhos, os sobreiros e outras árvores que resistiam no meio da mata cerrada. Depois construíram mesas e bancos de madeira aproveitando as sombras e os espaços para que uma ou mais famílias pudessem sentar-se e conviver. Nas encostas mais acentuadas criaram estrados de  madeira no meio das árvores, sem as danificar. Muitas famílias custearam as despesas de uma mesa, sabendo que aquele espaço seria público e não privado. Qualquer grupo poderá usar uma mesa à sua escolha.

Mais em baixo limparam a ribeira e reaproveitaram um antigo moinho activando-o. Ligaram as duas margens com um passadiço (ponte) de madeira, permitindo que depois de bem comidos e bebidos as pessoas possam fazer um percurso ali à volta. Criaram ainda um bar com serviço de café e outras bebidas e onde se podem concentrar mais pessoas em alegre convívio .
Aos Sábados ou Domingos quem quiser passar o dia naquele parque de merendas terá de  ir muito cedo reservar o lugar. 

(Poderão ver mais fotos no google, pesquisando:
Fotos do Pisão - Bajouca - Leiria)  

Artista 
Ali perto. descobrimos a casa de um artista local a quem alguns chamam de louco. Nos seus terrenos e com as suas economias foi desenhando, reinventando e construindo algumas coisas que desapareceram da vida e das lides diárias daquele povo.
O carro de bois, uma vaquinha puxando o engenho para tirar a água do poço, uma picota e até pequenos relevos representando cenas da vida na aldeia. Pessoas com sonhos e com vontade de preservar as memórias do passado.  

Fui fotografando algumas coisas, mas não consegui trazer nas fotos aquilo que se vê neste jardim. A casa estava fechada e todo aquele espaço está cercado com uma rede.  
Parabéns ao artista. 
Luíscoelho
Outubro/2014

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

Memórias do tempo


(Estrada 109 - localidade Ponte da Pedra)

Aconteceu naquela tarde de Agosto. O tempo estava a mudar. Algumas gotas  de chuva anunciavam a mudança. O Verão ia ser duramente ferido na sua beleza. O calor e o azul dos dias tornava-se agora cinzento, húmido e muito desagradável.
Mesmo assim, apesar de toda a mudança, decidimos sair. Hoje é Domingo, é dia de descanso.
- Vamos dar uma volta, beber um café, arejar as ideias... Sei lá...Vamos por aí...

Parámos aqui perto. Depois fiquei a olhar para o que sobrou daquela casa em frente. Tirei a máquina fotográfica e fiz um clic.
Aquelas ruínas mexeram comigo.
Muitas vezes olhei e não vi nada, mas hoje foi diferente.
Parece que habituámos o nosso olhar a uma rotina. Depois  não conseguimos ver mais do que uma imagem repetida.

Conheci esta casa ainda com vida. Chegou a ser «Uma casa de pasto» Taverna. Agora restam algumas paredes.
Todos os meses no dia 26, era dia de Feira. Eram dias de grande movimento. Na taverna não havia mãos a medir. Aviavam-se copos de vinho ou um traçadinho, uma ginja, uma aguardente ou outra bebida a gosto.
Algumas vezes acompanhavam as bebidas com bolos secos ou com passas de figos maduros. Faziam cama para a bebida e ao mesmo tempo selavam um negócio. A compra de uma junta de bois ou de outros animais. 

Ao longo da estrada 109 havia tendas de roupa e toda a sorte de louça de barro. Viam-se ainda as panelas de ferro e todas as ferramentas para os trabalhos agrícolas encostadas aos muros ou distribuídas ao longo dos passeios. 

As mulheres das Aldeias vizinhas alinhavam-se no meio das barracas ou nos espaços vazios mostravam lindos galos caseiros, coelhos ou patos e para completar aqueles pequenos espaços viam-se ainda algumas sacas com sementes. Vendiam também hortaliças, cebolas, batatas ao alqueire (medida convencionada). Estava tudo em exposição.
Elas iam oferecendo a quem passava em frente:
- Então freguês hoje não compra nada? Está tudo muito barato...Aproveite agora...
   
Depois alguém se lembrou de mudar o local da feira para o interior da mata - Charneca, onde não prejudicasse o trânsito nem os residentes.  
Não sei o que aconteceu, mas a casa de primeiro andar fechou. O tempo, a chuva e o vento foram transformando as paredes e minando o seu interior.
As últimas pessoas que ali se abrigaram eram pobres. Viam-se despidas de roupas e de higiene. 
Os miúdos, semi-nús, brincavam na encosta a Sul por entre algumas couves mais altas que eles  e onde uns cães esqueléticos lhes lambiam as mãos e o rosto. Um dia também eles partiram. 
Finalmente vieram umas máquinas e demoliram a parte da frente daquela casa. Havia o risco de derrocada para a estrada nacional.

Hoje restam estes pedaços de paredes, portas e janelas que conservam as marcas do abandono. 
Talvez um dia as máquinas voltem para limpar o que sobra daquela casa e as últimas memórias da Feira dos vinte e seis.
luíscoelho

domingo, 28 de setembro de 2014

Serões de antigamente

Uma Picota
Fotografia

(Parque de merendas da Bajouca - Leiria e Jardim privado de um artista local)


Depois da ceia, sentavam-se à volta da lareira. A família era numerosa, mas cabiam todos fazendo um círculo maior. 
Os pais protegiam os mais pequenos de modo que se aquecessem, sem se queimarem.
A vivacidade do lume e as labaredas eram um convite para um serão agradável. As chispas e as sombras criavam muita magia em todos os olhares.
No fim do serão, deixavam de alimentar a fogueira até que ela esmorecia no calor e nas sombras. Os mais velhos diziam:
- Quem não poupa a água e a lenha, não poupa nada que tenha. 

Antes de se deitarem, juntavam todo o braseiro para um monte cobrindo-o com a cinza que houvesse, evitando o perigo de  incêndio. Por outro lado, as brasas maiores conservavam-se acesas até ao amanhecer.
Na manhã do dia seguinte, desfaziam aquele monte de cinzas, procurando as brasas que estivessem ainda acesas. Acrescentavam-lhe alguma caruma seca para reacender a fogueira. Não existiam fósforos nem isqueiros.
Ouvi contar que era frequente irem pedir lume, algumas brasas, a casa dos vizinhos. Era um gesto simples, mas de muita valia. Todos precisavam da fogueira para cozinharem os alimentos e para se aquecerem.

Alguns dias acabava-se o pão: A tradicional broa de farinha de milho. Nestas ocasiões, iam pedir por favor, um pão emprestado para se remediarem. Mais tarde, quando coziam a sua fornada, retribuíam-no. Ninguém recusava um pão, ou apenas parte dele, para ajudar os vizinhos. Hoje são eles, mas amanhã poderemos ser nós, diziam.

Para passar o tempo ao serão, faziam-se jogos ou contavam-se histórias. Algumas vezes sobre acontecimentos da vida na aldeia e outras vezes, eram contos de bruxas, fadas ou coisas diabólicas que deixavam os mais novos arrepiados de medo. 
Recordo aquela história dos tesouros escondidos num terreno do avô Carnide. Situava-se logo a seguir à Quinta do Paul, na encosta das Picotas e antes da pedreira do gesso.  Era um terreno árido e arenoso.

Na parte mais alta, havia uma nascente natural. Então, escavaram um lago que se enchia da água dessa nascente. O lago tinha cerca de oito metros de comprimento por quatro de largura e um metro de profundidade.
No Inverno a água corria por um regato até ao ribeiro do Paul, mas no Verão era toda aproveitada para regar os canteiros de milho, feijão ou abóboras.
Esta água era sorteada por mais dois ou três confinantes uma vez que a Quinta foi dividida pelos herdeiros. Uns dias da semana regavam uns e nos restantes dias regavam os outros.

A água era tirada à picota. Um engenho que funcionava como uma balança. Era um madeiro comprido, de quatro ou cinco metros, assente num eixo de uma estaca colocada verticalmente. Na ponta desse madeiro colocavam uma vara comprida onde se engatava o balde e na outra ponta ajustavam o contrapeso, uma pedra. 

A pessoa que puxava a picota colocava-se num andaime, estrado de madeira, colocado por cima da água do lago. Puxava a vara e enchia o balde em baixo. Depois puxava para cima com a ajuda do contrapeso e despejava-o num tabuleiro de madeira que corria para a terra. O ritmo tinha de ser certo. 

Havia uma lenda sobre uns fantásticos tesouros enterrados naqueles terrenos.
Contava-se que naquelas encostas viviam mouras encantadas. Foram Princesas que fugiram dos seus palácios e dos seus países, e vieram ali esconder-se. Com elas trouxeram os seus tesouros. Morreram por desgosto de amor, mas os seus espíritos continuam por ali, junto das suas riquezas.
Foi há muitos, muitos anos, mas nas noites de luar ainda se viam brilhar aquelas jóias, pedras preciosas de todas as cores, correntes de ouro, e vestidos lindamente bordados com brilhantes.

Diziam que nas noites de lua cheia, perto da meia-noite as jóias brilhavam ainda mais. Parecia o nascer do Sol naquelas encostas. Elas, ainda apaixonadas, mostravam as suas riquezas ao luar. Depois, lentamente, tudo ia desaparecendo e as lindas mouras adormeciam em silêncio.
Nunca ninguém conseguiu aproximar-se naquelas horas. Talvez por medo, quem sabe...
As pessoas que durante o dia trabalharam as terras nunca encontraram qualquer tesouro, nem uma simples moeda.
A água da represa continua a correr silenciosa pelo regato. 
Os mais antigos diziam que aquela nascente eram as lágrimas das infelizes mouras que choravam dia e noite o seu desgosto de amor.

Luíscoelho