O Paulo namorava com uma linda
rapariga.
Ela, além de ser muito bonita, era também
desejada por todos os rapazes da aldeia.
Eram parentes em terceiro grau. O Paulo e
ela gostavam de se tratar por primos.
Os filhos dos irmãos do pai ou da mãe são primos
direitos ou em primeiro grau.
Depois os filhos desses primos são primos
em segundo grau e por último os filhos destes serão primos em terceiro grau. A
escala da linhagem continua.
Além da sua formosura era também filha de
uma das famílias mais ricas da terra. Possuidores de muitos pinhais, terras de
cultivo e de grandes vinhas.
A conquista não foi fácil.
Era preciso que os pais dela aceitassem o
namoro.
O noivo deveria ser trabalhador e ter
ainda outras qualidades de respeito e honestidade.
O tempo de namoro prolongou-se por mais de
dois anos. Tempo suficiente para aprenderem a amar-se e a respeitar-se.
Aprendiam também a conviver socialmente com as famílias de um lado e do outro.
Não eram permitidas grandes familiaridades entre os noivos.
Os beijos não existiam com a facilidade
com que hoje se troca um beijo como um cumprimento.
O Paulo foi para a tropa. Estava perto e
sempre que podia vinha à aldeia ver a sua família e também a namorada. Nesse
tempo já tinha uma bicicleta para fazer as viagens. Entendiam-se bem e havia
respeito de ambos os lados. Assim que pôde pediu a moça em casamento e de
imediato começaram a construção da sua casa.
O Paulo foi tentando a sorte. Cada dia
procurava ir um pouco mais além. Aconteceram os beijos às escondidas. Rápidos e
silenciosos. Depois aquelas mãos atrevidas subiram e desceram transportando
desejo e algo mais.
Dois meses antes do casamento o Paulo
conseguiu entrar em casa. Convenceu-a.
Depois da primeira vez tudo se tornou mais
fácil. Gostava ele e gostava ela. Brincavam.
As noites eram o seu esconderijo e o
silêncio revestiu-os de graciosidade e prazer.
Algum tempo depois começaram os enjoos.
- Estou grávida, disse-lhe a medo.
- Trabalho feito já não mete cuidados,
respondeu o Paulo. Já falta pouco tempo para o nosso casamento.
Vamos guardar este segredo só para nós e
tu vais ter cuidado para que tudo corra bem até ao fim.
- Mas isto foi um pecado...Vou
confessar-me. Não quero viver nesta dúvida e com este medo.
- Olha lá menina este é o nosso segredo, só nós dois é que sabemos e já é muito, se souberem três é demais.
Nem penses em confessar ao Padre nem
a ninguém das nossas vidas.
Vamos amar o nosso bebé e pedir a Deus que
ele venha bem e com saúde. O resto tudo se esquece. Depois de casados ninguém
te perguntará se foi antes ou depois nem se foi uma única vez ou se todos os
dias havíamos de nos aperfeiçoar ainda mais.
Agora só devemos tratar do nosso
casamento.
Como ainda eram parentes em terceiro grau
o Senhor Prior exigiu um imposto para lhes autorizar o casamento. As leis
canónicas não permitiam o casamento até ao terceiro grau. Se os noivos
quisessem casar-se teriam de pagar uma espécie de multa. Seria maior quanto
maior fosse o grau de parentesco.
Os mais penalizados seriam os primos
direitos ou em primeiro grau e depois ia decrescendo conforme a categoria.
Diziam que isto era para evitar consanguinidade.
Os bebés nascidos de pessoas com graus de
parentesco próximo poderiam ter graves problemas físicos ou mentais.
Correu tudo como o previsto. O Paulo e a
mulher estavam satisfeitos.
Oito meses depois do casamento nasceu um
belo rapaz que os encheu de alegria.
O Paulo contou este episódio das suas
vidas por duas ou três vezes e apenas no meio familiar. Sentia-se um herói.
Ela, ao contrário, ficava muito
envergonhada e dizia-lhe abertamente que estas conversas não eram para
divulgar.
Segredos são segredos e devem ser
guardados.
- Sabemos nós os dois e já foi
muito...todos os outros serão demais...
Luíscoelho
Julho/2014